Tecnologias podem ser aliadas para a melhoria da educaçãoEm recente entrevista ao jornal "Folha do Dia", fui questionado quanto à violência nas escolas contra os professores e também acerca do uso de blogs na educação no Brasil. No caso da primeira temática, o interesse era ampliar o debate acerca de uma questão bastante delicada e que tem sido alvo crescente de matérias publicadas pela imprensa. O ano de 2007 foi marcado por várias notícias sobre agressões praticadas contra os professores durante o seu expediente de trabalho e até mesmo fora dele.
O questionamento quanto aos blogs (diários virtuais eletrônicos produzido por milhões de pessoas ao redor do mundo todo) surgiu em virtude da pesquisa que estou realizando e que pretendo concluir no presente ano de 2008 para o meu doutorado na PUC-SP. Quando fui inquirido pela repórter já havia criado 3 blogs para captar informações para esse trabalho. Hoje, ainda como parte de minha experimentação, foram produzidos mais 10 blogs e ainda criei uma plataforma através da qual os internautas interessados em educação podem ter acesso a esses materiais. Esse "canal" de acesso aos meus blogs educacionais é um site particular e chama-se Observatório da Educação (
http://www.observatoriodaeducacao.com/).
No editorial dessa semana reproduzo os tópicos abordados na entrevista, conduzida pela jornalista Samanta Leandro. Seguem abaixo as questões e as respostas completas dadas ao jornal "Folha do Dia".
Folha do Dia - Como surgiu a idéia de criar um blog que fala sobre educação?
João Luís - Fiz uma palestra sobre o uso das novas tecnologias em educação para os professores da rede municipal de um grande município do interior de São Paulo, a cidade de Bauru. Todas as vezes que faço essas apresentações fico com a grata e sincera impressão de que os professores querem saber mais, aprender o que puderem sobre o assunto e realmente incorporar esses recursos ao seu cotidiano. Mas o dia a dia é opressor e, em virtude dessa particularidade, muitos deles acabam simplesmente voltando às práticas que sempre adotaram por falta de maior incentivo e também de novas informações (trocas de idéias) com quem já utiliza essas ferramentas. O blog foi a saída encontrada para podermos continuar em contato, aprofundando os saberes, introduzindo novas idéias, ajudando no caso de dúvidas ... Além disso, estou estudando blogs em educação para a minha tese de doutorado na PUC-SP.
Folha do Dia - Por que o blog recebe este nome "Escolhendo a pílula vermelha"?
João Luís - O nome relaciona-se ao título da palestra que ministrei naquela cidade e que tem como fator de motivação o filme "Matrix", a respeito do qual já produzi algo para o Planeta Educação (
http://www.planetaeducacao.com.br/), portal onde sou articulista e editor. A produção cinematográfica em questão é baseada na
Alegoria da Caverna do pensador grego Platão e tenta incitar as pessoas a saírem do marasmo, a refletirem sobre o seu cotidiano, a não aceitarem passivamente o que lhes é imposto ...
Folha do Dia - Você já passou por algum tipo de violência dentro da sala de aula?
João Luís - Felizmente nunca. Já presenciei alunos se agredindo e tive que interceder, mas pessoalmente nunca fui alvo de qualquer agressão. No caso dos alunos que se agrediram, procurei contar com o auxílio dos outros estudantes presentes para separar as moças que estavam se atracando (era uma turma de EJA - Educação de Jovens e Adultos) e acionei a direção para que as mediudas necessárias fossem tomadas pela coordenação e pela direção da escola.
Folha do Dia - Em algum momento de sua carreira como educador já questionou sua escolha?
João Luís - Sim. Antes de responder a pergunta gostaria de dizer que sou muito feliz e que a escolha que fiz foi consciente e em primeira opção. A educação é um campo de dificuldades e problemas, mas a despeito disso creio sinceramente que é uma das únicas (sendo a única) via real de aperfeiçoamento, crescimento, maturação e inclusão social e econômica. No Brasil, os discursos políticos sempre enaltecem o valor da educação, mas pouco ou nada fazem para realmente ajudar a melhorar a qualidade do ensino-aprendizagem nacional (isso não lhes interessa. População esclarecida representa cobranças, autonomia, criticidade e maior participação política). Qual grupo/partido político brasileiro quer ser incomodado pelo povo? É melhor manter a massa na ignorância e afagar-lhes a cabeça com cestas básicas, bolsas-famílias e outros paliativos sociais ... Quanto a se questionei minha opção ... Sim, no caso quando trabalhei numa escola que adotava sistema pré-vestibular e que era conteudista, se preocupando apenas em dar aulas e não em formar os alunos do ensino médio. Além de não concordar com a sistemática e clientela, formada eminentemente por estudantes de classe média alta, era desinteressada e parecia não se preocupar com o futuro, pois seus pais já haviam conquistado algum sucesso e eles se viam como beneficiários daquele patrimônio. Foi um ano apenas, mas o suficiente para que eu pensasse em ir vender sanduíche natural e água de côco na praia ... O desgaste foi enorme e ao final daquele ano fatídico pedi demissão e fui em busca de novos ares ... (Ainda bem!).
Folha do Dia - Você tem colegas que já foram vítimas da violência física ou verbal?
João Luís - Sim. Alguns deles pediram transferência das escolas em que trabalhavam. Outros mudaram de profissão. Há também os persistentes, que desafiaram os problçemas e que tentaram continuar ...
Folha do Dia - No blog muitos professores contam suas histórias, mas não se identificam. Isto é uma forma de se proteger de possíveis vinganças de alunos?
João Luís - Pode ser. Penso também que é uma forma de não expor publicamente a sua privacidade. São casos que não deixam ninguém à vontade. Mesmo sendo as vítimas, os professores sentem vergonha e humilhaão em situações como essas. O desrespeito à integridade física e moral dos educadores brasileiros e as condições impróprias de trabalho tem afetado a auto-estima de quem trabalha em escolas.
Folha do Dia - O blog tem o poder de ajudar professores a suportarem o problema?
João Luís - Não posso afirmar isso. Creio que é uma ferramente que auxilia ao criar elementos de diálogo, troca de iséias e até mesmo para que as pessoas se sintam à vontade para expor suas feridas sem que sua privacidade seja ferida ou invadida.
Folha do Dia - O governo dá suporte para professores que já sofreram violência?
João Luís - Não tenho informações sobre o assunto. O que sei é que alguns professores agredidos conseguem transferir-se para outras escolas.
Folha do Dia - Há casos de professores que dão aos alunos mais liberdade do que o normal. Isto faz com que os alunos ultrapassem limites?
João Luís - Liberdade é uma palavra que todos conhecem, mas que poucos entendem o real significado. A incompreensão do sentido da palavra é uma conseqüência da educação capenga e deficiente que temos no país. Nossos alunos raramente são levados a pensar sobre a questão. Os professores não se preocupam com isso, apenas querem cumprir planejamentos e programas curriculares. No início de cada ano devem ser estabelecidos de comum acordo entre o professor e a turma de alunos as bases de convivência (que podem e devem ser amigáveis, mas há papéis a serem cumpridos e uma hierarquia própria do ambiente a ser respeitada). O professor tem que se impor, sem ser autoritário, e definir os planos de ação, as tarefas a serem desenvolvidas, os projetos individuais e grupais, as estratégias a serem utilizadas, a metodologia de ensino e também conhecer o conteúdo de sua disciplina. Ao fazer isso e orientar as ações, utilizando-se do diálogo como ferramente primordial nas relações que trava com os alunos, as possibilidades dos alunos ultrapassarem os limites diminuem ... Mas isso não é uma receita, afinal de contas os contextos são diferentes, as turmas variam de ano para ano e de localidade para localidade ...
* Além do blog "Escolhendo a pílula vermelha", o site Observatório da Educação dá acesso aos seguintes blogs educacionais:
* Sala de Aula do Observatório
* Observatório da Educação
* Tech Educação
* Ciência, Eficiência e Consciência
* O Mundo dos Números
* O Mundo em Reconstrução
* Vídeos Nota 10
* Opinião de Educador
* Cinema de Primeira
* Gargalhadas Mil
João Luís Almeida Machado é editor do portal Planeta Educação; Doutorando pela PUC-SP no programa Educação: Currículo; Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP); professor Universitário e Pesquisador